António Gedeão – 2 poemas
António Gedeão
(pseudonym of Rómulo de Carvalho) …
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… wrote these two poems that can be quite an illustration to the «Idea of Progress»:
PEDRA FILOSOFAL / PHILOSOPHER’S STONE
[published in: Movimento Perpétuo, 1956]
Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida tão concreta e definida como. outra coisa qualquer, — |
They don’t know that the dream is a constant part of our life as concrete and as defined as any other possible thing, — |
como esta pedra cinzenta em que me sento e descanso, como este ribeiro manso em serenos sobressaltos, — |
as this grey stone on which I sit and I rest, as this serene brook so gently stirring, — |
como estes pinheiros altos que em verde e oiro se agitam, como estas aves que gritam em bebedeiras de azul. — |
as these tall pine trees waving in gold and in green, as these birds that cry intoxicated with blue. — |
eles não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento, de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo num perpétuo movimento. — |
They don’t know that dreams are wine and foam and they’re leaven, tiny animal, smart and eager, its pointed muzzle fussing through in a perpetual motion. — |
Eles não sabem que o sonho é tela, é cor, é pincel, base, fuste, capitel, arco em ogiva, vitral, — |
They don’t know that a dream is canvas, is colour, is brush, is base and schaft and capital, is a lancet arch, is a stained glass, — |
pináculo de catedral, contraponto, sinfonia, máscara grega, magia, que é retorta de alquimista, — |
it’s a cathedral pinnacle, a counterpoint, a symphony, a Greek mask, a magic, it’s an alchemist’s retort, — |
mapa do mundo distante, rosa-dos-ventos, Infante, caravela quinhentista, que é cabo da Boa Esperança, — |
it’s the map of a distant world, it’s a compass, it’s the Infante (*) it’s a 16th century caravel, beeing a Cape of Good Hope, — |
ouro, canela, marfim, florete de espadachim, bastidor, passo de dança, Colombina e Arlequim, — |
beeing gold, cinnamon, ivory and a swordsman’s foil, beeing a theatre wing, a dancing step, Columbine and Harlequin, — |
passarola voadora, pára-raios, locomotiva, barco de proa festiva, alto-forno, geradora, — |
beeing the flying «passarola», a lightning rod, a locomotive, a ship of festive prow, a blast-furnace, a generator, — |
cisão do átomo, radar, ultra-som, televisão, desembarque em foguetão na superfície lunar. — |
beeing atom’s fusion, beeing radar, beeing ultrasound, television, beeing a rocket landing on the surface of the moon. — |
Eles não sabem, nem sonham, que o sonho comanda a vida, que sempre que um homem sonha o mundo pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança. — |
They neither know, nor dream, that dreams command life. that whenever a man dreams the world bounces and advances, as a coloured ball held by the hands of a child. — |
* Prince Henry, the Navigator |
FALA DO HOMEM NASCIDO / – – – – – – –
[published in: Teatro do Mundo, 1958]
Venho da terra assombrada do ventre de minha mãe não pretendo roubar nada nem fazer mal a ninguém — |
trad… |
Só quero o que me é devido por me trazerem aqui que eu nem sequer fui ouvido no acto de que nasci — |
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Trago boca pra comer e olhos pra desejar tenho pressa de viver que a vida é água a correr — |
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Venho do fundo do tempo não tenho tempo a perder minha barca aparelhada solta rumo ao norte meu desejo é passaporte para a fronteira fechada — |
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Não há ventos que não prestem nem marés que não convenham nem forças que me molestem correntes que me detenham — |
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Quero eu e a natureza que a natureza sou eu e as forças da natureza nunca ninguém as venceu — |
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Com licença com licença que a barca se fez ao mar não há poder que me vença mesmo morto hei-de passar com licença com licença com rumo à estrela polar. |
António Gedeão
(pseudónimo de Rómulo de Carvalho)
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deixou-nos os dois poemas que bem servem de introdução à temática do »Progresso»:
PEDRA FILOSOFAL
[publicada em: Movimento Perpétuo, 1956]
Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida tão concreta e definida como outra coisa qualquer, — |
Eles não sabem que o sonho é tela, é cor, é pincel, base, fuste, capitel, arco em ogiva, vitral, — |
como esta pedra cinzenta em que me sento e descanso, como este ribeiro manso em serenos sobressaltos, — |
pináculo de catedral, contraponto, sinfonia, máscara grega, magia, que é retorta de alquimista, — |
como estes pinheiros altos que em verde e oiro se agitam, como estas aves que gritam em bebedeiras de azul. — |
mapa do mundo distante, rosa-dos-ventos, Infante, caravela quinhentista, que é cabo da Boa Esperança, — |
eles não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento, de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo |
ouro, canela, marfim, florete de espadachim, bastidor, passo de dança, Colombina e Arlequim, — |
num perpétuo movimento. | passarola voadora, pára-raios, locomotiva, barco de proa festiva, alto-forno, geradora, — |
cisão do átomo, radar, ultra-som, televisão, desembarque em foguetão na superfície lunar. — |
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Eles não sabem, nem sonham, que o sonho comanda a vida, que sempre que um homem sonha o mundo pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança. |
FALA DO HOMEM NASCIDO
[publicada em: Teatro do Mundo, 1958]
Venho da terra assombrada do ventre de minha mãe não pretendo roubar nada nem fazer mal a ninguém — |
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Só quero o que me é devido por me trazerem aqui que eu nem sequer fui ouvido no acto de que nasci — |
Não há ventos que não prestem nem marés que não convenham nem forças que me molestem correntes que me detenham — |
Trago boca pra comer e olhos pra desejar tenho pressa de viver que a vida é água a correr — |
Quero eu e a natureza que a natureza sou eu e as forças da natureza nunca ninguém as venceu — |
Venho do fundo do tempo não tenho tempo a perder minha barca aparelhada solta rumo ao norte meu desejo é passaporte para a fronteira fechada |
Com licença com licença que a barca se fez ao mar não há poder que me vença mesmo morto hei-de passar com licença com licença com rumo à estrela polar. |